Elis

Eu queria dar o nome. Queria alisar a barriga de minha mãe para sentir que ela se movia dentro.

-Qual o nome? Perguntou mamãe no dia de sol.

-Margarida.

-Mas por quê? (só os filhos respondem os porquês dos sete anos convincentemente)

-É o nome da minha amiga de aula, que é albina. Eu acho ela linda.

A avó riu, dizendo que parecia nome de bisavó. Só vó Maria poderia fazer dessa uma dedução lúcida e engraçada ao mesmo tempo.

Quando Elis chegou no colo de mamãe em casa, já era Elis.  Seu cabelo castanho, tufo arrepiado. As mãozinhas fofas, com furinhos. Era minha margarida. Minha flor-bebê. Eu virei uma abelha na hora em que a vi. Por dias fiquei sobrevoando e zumbindo palavras suaves em seu ouvido. Aprendi a falar baixinho para não perturbá-la. Pedi para não ir à aula, para poder ficar rondando. Com uma semana já sabia todos seus chorinhos. Mamãe não pôde estar a sós com a bebê. Eu fechava as janelas para a hora do banho, escolhia as roupinhas, segurava a mão enquanto ela mamava. Assim, o umbigo caiu. E ali me conectei instantaneamente.

Nosso avô Ary fala que ela é a atriz preferida dele. Por motivos de saúde, ele nunca pôde assistir sua atriz no palco. Mal sabe ele que só viria a reafirmar seu pensamento. No Teatro algumas vezes (menos vezes das que quis), pude comprovar o seu talento. Senti-me diversas vezes em seu jardim, contemplando novamente minha flor.

A admiração é uma coisa que leva tempo. E minha admiração por Elis foi construída em cada folhinha de bem-me-quer. É tudo que eu vislumbraria ser. Realista, firme, consistente (com um milhão de pozinhos de pólen de braveza). Tudo que não sou: o coração enorme, altruísta. A vontade de contestar, exigindo que se exerça o bem. Quando minha flor saiu para o mundo, em busca dos seus sonhos, eu vibrei em emoção. Foi isso, foi espalhar seu dom.

E quando um dom se espalha, é para tocar vidas. É como um sol no dia de flor. Um narizinho de palhaço acariciando uma bochecha. Uma abelhinha que ronda o sorriso de quem não desiste.

Minha doce Elis, não se inquiete. Que nossa vida é palco, e improvisa quem batalha. E você é presente que chega na manhã, de leve, com covinhas no semblante.

Mamãe tinha afinal, razão.
É o seu nome que deveria ser dado à flor.

Luiza Versamore







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